Voltar às aulas quando ainda não chegamos ao auge da pandemia será uma decisão irresponsável, certamente induzida por motivação política, e não por critérios de saúde.
por Celso Napolitano
Voltar às aulas quando ainda não chegamos ao auge da pandemia será uma decisão irresponsável, certamente induzida por motivação política, e não por critérios de saúde.
Ao se planejar o retorno, os profissionais de educação devem ser ouvidos, devem participar na elaboração de protocolos de acolhimento, já que estamos na linha de frente da educação.
Não bastam critérios para a recepção de alunos nas escolas. Os seus pais e também os educadores devem ser ouvidos – e iremos ampliar o debate e até levar o caso ao Ministério Público se a suspensão de aulas for relaxada antes que se tenha o controle do novo coronavírus.
No plano do Estado de São Paulo, apresentado na última quarta-feira (24), apenas os donos de escolas foram consultados. Nenhum professor, nenhum funcionário administrativo participou do planejamento até agora. A pedagogia e as relações de trabalho foram deixadas em segundo plano. Os docentes estão expostos: mesmo o cálculo de 35% de alunos na primeira fase do retorno iria obrigar o professor a 100% de participação.
Durante os três meses em que tem durado este período de suspensão de aulas, professoras e professores foram submetidos a um brutal excesso de trabalho. Para evitar o contágio e a disseminação do vírus, a receita do afastamento social obrigou o fechamento das escolas e a recomendação de que todos ficassem em casa. Mas, ao contrário de muitos profissionais que interrompem seu trabalho quando confinados, professores foram instados a continuar trabalhando, continuar dando aulas, do jeito que desse, e com resultados preocupantes.
Em função de decretos de quarentena, os professores foram abruptamente transferidos para o regime de teletrabalho ou home office. Essa mudança, de uma hora para outra, provocou uma alteração radical de planejamento pedagógico, pois a atividade docente realizada de modo presencial é substancialmente diferente daquela exercida em ambiente virtual.
Assim, é preciso notar que o que está sendo feito durante esta quarentena não é, tecnicamente, “ensino a distância”. O que temos agora são “aulas a distância”. Simplesmente, em um intervalo curtíssimo de tempo, os professores tiveram que alterar todo o seu planejamento e adaptar-se ao ambiente virtual, com todas as consequências que isso representa: falta absoluta de controle sobre o grupo de alunos, planejar o roteiro das aulas e transformá-las em viodeoaulas, lidar com equipamentos tecnológicos e adaptar o ambiente de suas residências em “estúdios” de transmissão ou de gravação – uma verdadeira invasão no ambiente doméstico, em um momento em que suas famílias também estavam submetidas ao isolamento social.
Colaboramos até agora. As educadoras, os educadores e os profissionais de educação não foram devidamente consultados quando se decretou a suspensão de aulas e, agora, não estão sendo levados em consideração quando se fala em relaxar a quarentena. Os educadores são os elementos principais desta relação e nesse acolhimento no retorno às aulas. Nós, profissionais da educação, também temos que participar desse acolhimento. E temos também que ter nossa opinião levada em consideração e respeitada.
As nossas vidas, o nosso bem-estar, também estão em jogo.
* Celso Napolitano é presidente do Diap. Texto originalmente publicado no caderno Tendências/Debates, da Folha de São Paulo, edição de 29.jun.2020.
Fonte: Departamento Instersindical de Assessoria Parlamentar – Diap