“O respeito recíproco e a participação de todos são fundamentais para que a sociedade brasileira seja mais democrática e igualitária”. por João Domingos Gomes dos Santos
Há 125 anos, mais exatamente em 13 de maio de 1888, no Paço Imperial, centro do Rio de Janeiro, então capital do país, o povo acompanhou a assinatura da Lei Áurea pela princesa regente, Dona Isabel. No plenário do Congresso Nacional, o então ministro da Agricultura, Rodrigo Silva, leu o projeto de lei do Governo Imperial relativo ao fim do trabalho escravo. Durante o ato histórico, deputados protestaram contra a queima de todo o arquivo da escravidão no Brasil. “A vergonha nunca há de deixar de existir; não é a cremação que a fará desaparecer”, afirmou o então parlamentar Lamonier Godofredo.
O Brasil foi o último país independente das Américas a abolir a escravatura. Um modelo que teve início com a chegada dos portugueses ao Brasil por volta do século XVI – com a vinda dos primeiros africanos, em 1594 –, iniciando-se um processo gradativo de discriminação racial. O fim da escravidão, porém, não se concretizou em ações de governo para garantir a plena inclusão da população negra. Ao contrário, aos negros restaram o preconceito e a discriminação. É reconhecida historicamente a situação de abandono a que foram relegados os negros, após a abolição.
A previsão de Lamonier se reflete ainda hoje, diante da permanente luta contra o preconceito e o racismo, após mais de um século da proclamada alforria. A luta pela liberdade dos negros é permanente. Se antes, portugueses e holandeses falharam na tentativa de aniquilar os quilombos; hoje, rompidas as correntes, é patente a resistência do povo negro pela igualdade social e de oportunidades.
O Brasil é um país rico em diversidade étnica e cultural, que teve origem na nossa colonização, com reflexos na construção da nossa identidade. A Fundação Cultural Palmares, do Ministério da Cultura, mapeou 3.524 comunidades quilombolas. “Convivem hoje no território brasileiro cerca de 200 etnias indígenas, além da imensa população formada pelos descendentes de africanos, imigrantes e descendentes dos povos originários, de diferentes tradições culturais”. Estudiosos apontam que a discriminação “é resultado e instrumento desse complexo de relações e tem levado grande parte da nossa população à exclusão social”.
Relatório divulgado pela Organização Internacional do Trabalho – OIT mostra, por exemplo, que problemas históricos do país ainda persistem no mercado de trabalho. De acordo com os índices levantados, as mulheres, os negros e os jovens têm menos oportunidades e salários mais baixos do que homens brancos com mais idade. Os negros – parcela da população que inclui pretos e pardos – recebem por hora, em média, 60,4% do valor pago às demais camadas populacionais. O índice de acesso às políticas públicas voltadas para a saúde, a educação, a cultura, também é inferior ao da população branca.
Mesmo assim, apesar de tímidas, as mudanças na legislação e a adoção de políticas sociais pelos governos têm sido significativas, se comparadas a séculos de exploração e desrespeito à população negra. Pesquisas mostram a redução considerável no número de atitudes racistas, porém, especialistas no tema avaliam que isso ocorre não pela conscientização das pessoas, mas por receio de sofrerem alguma penalidade. “Embora seja uma tarefa difícil, é responsabilidade da sociedade, de forma geral, superar o preconceito; construir e preservar valores que envolvam o respeito entre as pessoas; estabelecer as possíveis relações em meio às diferenças”, ressaltam. O desejo de igualdade deve-se refletir de alguma maneira na sociedade, promovendo a conscientização e colocando em prática ações afirmativas pela igualdade de oportunidades e cidadania. E no combate à discriminação e ao preconceito, a escola tem papel fundamental, pois é lá que a criança convive e poderá aprender com a diversidade.
Desde a promulgação da Constituição de 1988, o país desenhou um novo ordenamento institucional da nação; importantes direitos foram incorporados ao novo texto constitucional, aliados a conceitos amplos e democráticos. No entanto, depois de duas décadas de vigência da Constituição Cidadã, não conseguimos transformar em prática, muitos dos princípios que a Carta propõe. Também o crescimento econômico alcançado nas últimas décadas não beneficia a maioria da população; é exclusivo e concentrado e seus possíveis efeitos não melhoram as condições de vida das camadas pobres. Sendo assim, cabe aos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário tomarem as providências cabíveis para promover a inclusão social e a integração de todos, independentemente de etnia, de sexo, de idade, de religião.
A Confederação dos Servidores Públicos do Brasil – CSPB tem como uma de suas bandeiras permanentes o respeito à diversidade e às chamadas “minorias”, com participação de todos os segmentos nos campos econômico, político e social. A CSPB busca a afirmação de uma nova proposta histórica: a conquista do Estado Social Democrático de Direito, que deverá estruturar-se em princípios de participação direta de toda a sociedade organizada, onde o interesse coletivo esteja acima dos interesses individuais. O respeito recíproco e a participação de todos são fundamentais para que a sociedade brasileira seja mais democrática e igualitária.
Presidente da Confederação dos Servidores Públicos do Brasil (CSPB)
João Domingos Gomes dos Santos